Hormônio: funciona para Acondroplasia e Hipocondroplasia?

Uma dúvida comum sobre o tratamento para Acondroplasia e Hipocondroplasia é sobre a eficiência do hormônio de crescimento. Por isso convidamos duas endocrinologistas infantis especialistas para falar sobre o assunto.

Renata/ Foto: Youtube

Confira as entrevistas completas de Renata Machado Pinto, também mestre em Genética, docente e doutoranda da Universidade Federal Goiás; e de Ivana Cristina Santana Augusto, Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

Ivana/ Foto: Fillium

STG: Alguns médicos defendem que o hormônio do crescimento funciona para hipocondroplasia mas não para Acondroplasia. Qual a sua opinião e porque?

Renata: Na verdade o hormônio de crescimento (GH) tem efeito nas duas condições, mas com resposta menor nos acondroplásicos. Isso se deve pela maior gravidade desta displasia óssea.

É bom lembrar que o tratamento com GH não atua na causa da baixa estatura das crianças portadoras de Hipocondroplasia e Acondroplasia. Essas crianças não tem falha na secreção do GH, mas o uso da medicação melhora parcialmente a baixa estatura.

Na literatura científica existem diversos relatos de caso e pequenas séries de pacientes acondroplásicos que se beneficiaram com o uso do GH. Os resultados variam bastante, e no mais recente estudo de Metanálise (compilação de várias pesquisas), mostra melhora de um desvio padrão na estatura, o que equivale a um ganho real (além do que cresceria sem hormônio) de em torno de 7 cm.

(Miccoli M,  Bertelloni S, Massart F.Height Outcome of Recombinant Human Growth Hormone  Treatment in Achondroplasia Children: A Meta-Analysis. Horm Res Paediatr. 2016. DOI: 10.1159/000446958)

Ivana: Ainda existem poucos estudos, com número pequeno de pacientes e pouco tempo de uso do hormônio em acondroplasia, e o resultado desse tratamento na estatura final do paciente e no aumento da desproporção dos membros é limitado. Existem mais de 100 subtipos de hipocondroplasia com graus variados de displasia óssea, por isso o resultado nestes pacientes são muito variáveis.

STG: Você já iniciou tratamentos que comprovem esta teoria?

Renata: Tenho alguns pacientes acondroplásicos que utilizam o GH, e a resposta varia de acordo com vários fatores: hábitos de vida, qualidade do sono e alimentação, outras doenças associadas, fase da puberdade, conservação do medicamento e utilização correta.

Ivana: Não tenho nenhum paciente usando. Já usei em 2 pacientes com hipocondroplasia com grau leve de desproporção óssea com bons resultados.

STG: Qual o benefício prático do tratamento hormonal e em quanto tempo é possível reconhecer algum resultado?

Renata: Logo no início se percebe um aumento da velocidade de crescimento, já perceptível nos primeiros 3 meses. Para crianças que não estão em puberdade espera-se que cresçam 8 cm no primeiro ano. Na puberdade essa velocidade pode chegar a 10 cm para as meninas e 12 para os meninos.

Ivana: O resultado varia muito de acordo com o diagnóstico e os resultados já são obtidos com 6 meses do início do tratamento.

STG: Existem efeitos colaterais?

Renata: Quando administrado em doses corretas, a maioria dos pacientes não apresenta efeitos adversos. Os efeitos mais comuns são: dor de cabeça, edema de mãos e pés. É muito raro que ocorra complicações no local de aplicação (irritações, infecções). Um efeito colateral raríssimo é o aumento da pressão intracraniana (pseudo tumor cerebral) relacionada a altas doses.

Ivana: O hormônio de crescimento é muito seguro com poucos efeitos colaterais quando usados nas indicações já estabelecidas e liberadas para uso.

STG: Quais os tipos de Nanismo que podem ser tratados com hormônio e a partir de qual idade é ideal iniciar o tratamento?

Renata:

Tabela 1 – Indicações aprovadas em bula pelo FDA para o uso do GH em crianças

Situação clínicaCID 10Posologia: UI ou mg/kg/dia
Deficiência de GH (DGH)E 230,1 UI ou 0,033 mg
Síndrome de Prader Willi (SPW)Q 870,1 UI ou 0,033 mg
Retardo crescimento intra-uterino (RCIU)P 050,15 – 0,2UI ou 0,05 – 0,067 mg
Síndrome de Turner (ST)Q 960,15 – 0,2UI ou 0,05 – 0,067 mg
Síndrome de Noonan (SN)Q 950,15 – 0,2UI ou 0,05 – 0,067 mg
Baixa estatura Idiopática (BEI)E 430,1 – 0,15 UI ou 0,033 – 0,05 mg
Insuficiência renal crônicaN 180,15 UI ou 0,033 mg

Além do uso liberado em bula, o GH tem sido usado “off lable”, porém com embasamento científico, em outras situações como: displasias ósseas (incluindo hipo e Acondroplasia)  e doenças crônicas em uso prolongado de glicocorticóide (Lupus, Artrite reumatóide, etc).

Ivana: O hormônio de crescimento é liberado para deficiência de hormônio de crescimento, síndrome de turner, baixa estatura idiopática, quando o feto é pequeno para idade gestacional, insuficiência renal crônica e síndrome de Prader Willi. Nestes casos quando mais cedo começarmos melhores os resultados.

STG: É possível conseguir o tratamento hormonal via rede pública de saúde?

Renata: O Ministério da Saúde (MS) fornece a medicação apenas para portadores de S. de Turner, S. de Prader Willi, Insuficiência Renal Crônica e Deficiência de GH.

Os critérios diagnósticos para deficiência de GH (DGH) merecem considerações. Os testes de provocação do GH apresentam várias armadilhas.  O valor de normalidade do pico de GH nos testes de estímulo varia de acordo com o método utilizado; sendo: > 3,3ng/ml para anticorpos monoclonais, > 5ng/ml para imunofluorescência, > 7ng/ml para radioimunoensaio e > 10ng/ml para quimioluminescência.

O MS considera o valor de corte de 5 ng/ml independente do método, o que deixa de incluir vários pacientes. Atualmente a grande maioria os laboratórios utiliza a Quimioluminescência, método mais sensível, e cujo valor de corte é 10ng/ml.

A partir dos 4 anos de idade já se pode iniciar o tratamento com o GH.

Ivana: Na rede pública o hormônio de crescimento só é liberado para deficiência do hormônio de crescimento e síndrome de turner.

STG: Em quais situações clínicas não deficientes do GH, ele também é indicado?

Renata: Vide tabela 1 acima.

Ivana:  O hormônio de crescimento é indicado também para baixa estatura idiopática, criança pequena para idade gestacional, criança com insuficiência renal crônica, síndrome de Prader Willi.


Devido à alta relevância, o assunto também foi pauta do 3º Congresso de Nanismo que aconteceu em Goiânia no último mês de novembro. Dr. Wagner Baratela deu sua opinião: “Em Acondroplasia não há um consenso sobre o uso do hormônio. Não indicamos. Sei que às  vezes endocrinologistas tem resultados bons, mas não temos confiança de aplicar este tratamento. Para Hipocrondroplasia já é um consenso maior entre pediatras, endocrinologistas e geneticistas de que dar o hormônio de crescimento pode interferir na estatura final. Para acondroplasia, o custo benefício não é bom. O benefício talvez não justifique o uso de um hormônio que tem efeito colateral”.

Leia a matéria sobre a participação do geneticista no evento mais importante sobre baixa estatura do Brasil e assista também à suas duas palestras completas:

Geneticista Wagner Baratela no 3º Congresso de Nanismo

Rafaela Toledo

Comentários

3 respostas

  1. Meu filho tem 3 anos e 6 meses, a 2 meses atrás o endocrinologista encaminhou para um geneticista, onde ele com análise de todos os exames me disse que meu pequeno tem “hipocondroplasia”.
    Pra mim é tudo muito novo , uma mistura de sentimentos , estou a procura de mais informações sobre o caso , tratamento, enfim preciso de ajuda com maiores esclarecimentos.

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