Medicamento de alto custo é indicado para crianças e jovens com acondroplasia, tipo mais comum de nanismo
Depois de mais de 3 anos desde a primeira aplicação de Voxzogo no Brasil, o medicamento já é utilizado por quase 500 crianças no país, segundo dados atualizados da BioMarin. A medicação, indicada para crianças e adolescentes com acondroplasia – tipo mais comum de nanismo – foi liberada pela Associação Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em novembro de 2021 e aplicada na primeira criança brasileira no início de 2022. Segundo a farmacêutica, já são mais de 3.500 pacientes em uso no mundo todo. Inicialmente indicada para maiores de 2 anos, teve alteração na bula e desde setembro de 2023, a Anvisa liberou o uso no Brasil para bebês a partir de 6 meses até o fechamento das placas de crescimento.
Juliana Araújo, de 37 anos, é mãe da Alice Gonçalves, de 5 anos, com diagnóstico de acondroplasia. Natural de Porto Seguro (BA), a menina começou o tratamento com Voxzogo em abril de 2023. Na primeira dose, tinha 3 anos de vida. A família entrou com pedido judicial e conseguiu a medicação aproximadamente 6 meses depois. A menina, que já fez cirurgia de descompressão do forame magno e adenoide, teve a vida significativamente melhorada depois do medicamento.
“Alice teve diminuição de crises de sinusite e otite que antes eram muito frequentes e hoje não reclama de dor nenhuma. Todas as mães de crianças com acondroplasia com as quais já conversei falam sobre as dores. Percebemos mudanças nas proporções do corpo e muitas mudanças na autonomia. Hoje ela faz muitas coisas sozinha que antes não conseguia como ir ao banheiro e subir escadas. O arqueamento das pernas – característica comum da condição – também diminuiu muito. Eu não consigo imaginar Alice parando com essa medicação, voltando a sentir dores, a ter desproporções e pernas mais arqueadas. Esse remédio pra mim é importante como a vida”, completa.
Em João Pessoa, outra Alice sonha com a medicação
Com 3 anos e 2 meses, Alice Vitória Santana de Oliveira espera pela medicação desde novembro de 2023. A mãe, Renata Santana, de 37 anos, conta que foi nessa data que o processo judicial teve início e desde então a luta continua. “Em pouco mais de um mês saiu a tutela de urgência que foi barrada em segunda instância. Recorremos e pedimos uma perícia que foi novamente negada e agora estamos aguardando um parecer da União”, explica Renata.

A menina tem lordose, apneia e vai precisar de uma cirurgia de adenoide. A expectativa da família era de que, com a medicação, as comorbidades diminuíssem, mas ela nunca recebeu. “Entrei no grupo do Instituto Nacional de Nanismo (INN) antes dela nascer para me inteirar das displasias e receber apoio. O diagnóstico foi muito difícil. E aí eu soube também da medicação, das comorbidades e das dificuldades encontradas pelas crianças”, recorda.
Medicação suspensa há quase 1 ano
Jhonatas Jerônimo, de 5 anos, mora em Lajeado (PE) e depois de 6 meses usando o medicamento, ele teve as entregas suspensas. A última dose foi em 5 de novembro do ano passado, mas a decisão judicial que suspendeu o remédio é de um pouco antes, é do mês de setembro de 2024. Lamentando a situação, a mãe, Maria Juliana Jerônimo, de 34 anos, diz que mesmo com o curto tempo de medicação, as mudanças foram promissoras e significativas.

Além do diagnóstico de acondroplasia, Jhonatas tem Transtorno do Espectro Autista (TEA) com nível 1 de suporte. Com as demandas de terapias e tratamento, a mãe, que é técnica de saúde bucal e trabalhava como gerente de uma clínica odontológica, teve que parar de trabalhar para garantir os tratamentos ao filho. “Durante o uso do Voxzogo, ele melhorou 100% as crises de dores crônicas de cotovelos e tornozelos. Melhorou o sono, a apneia e diminuiu as otites. Tinha mais autonomia, ganhou força e começou a subir sozinho no sofá, na cama. Na escola, não precisava mais de ajuda para sentar. Após o primeiro mês de uso ele também começou a falar mamãe, que antes não falava. A psicóloga acredita que o aumento da autonomia pode ter ajudado”, completou.

Muito mais que altura
Presidente do Instituto Nacional de Nanismo (INN), Juliana Yamin explica que o uso do Voxzogo é uma conquista de pacientes que sofrem com uma doença rara, que é a acondroplasia. Essa doença não causa só um crescimento menor que a média, mas, acima de tudo, comorbidades muito importantes. Inclusive, pode causar morte na primeira infância.
“Para nós, do INN, a luta segue na incorporação porque, de fato, muitas famílias que têm mais dificuldade de acesso, seja porque estão em cidades muito menores e sem estrutura de defensoria pública, etc., não têm acesso. Ou seja, a judicialização acaba impactando negativamente justamente a população mais carente, que depois tem muito menos condição de buscar tratamento adequado para as comorbidades desse filho. Então, é importante que o SUS olhe para essa questão como uma questão de saúde pública. importante porque, de fato, são pouquíssimos os médicos e profissionais que entendem sobre a acondroplasia e, em todo o Brasil, muitas crianças sofrem pelas comorbidades que a doença causa”, acrescentou.
O que é o Voxzogo?
Liberado pela Anvisa em novembro de 2021, o Voxzogo é um medicamento para crianças e adolescentes com acondroplasia, o tipo mais comum de nanismo. Desde setembro de 2023, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) alterou a bula do medicamento e liberou o uso para bebês a partir de 6 meses até o fechamento das placas de crescimento. O remédio foi aplicado pela primeira vez no Brasil no início de 2022 e estimula o crescimento, além de diminuir as complicações causadas pela deficiência.
Quando o medicamento foi aprovado no Brasil, as duas principais agências reguladoras do mundo já haviam liberado a utilização: a Agência Americana – Food and Drug Administration (FDA) e a Agência Europeia de Medicamentos – European Medicines Agency (EMA). Como a droga ainda não integra o Sistema Único de Saúde (SUS), as famílias têm recorrido à Justiça para garantir o acesso.
Sobre a acondroplasia
Decorrente de mutações no gene FGFR3, a acondroplasia é a causa mais comum de displasia óssea que leva à baixa estatura desproporcional. Como implica em alterações no desenvolvimento da cartilagem das placas de crescimento, o quadro resulta em baixa estatura. Em média, os homens têm 1,31 m de altura, enquanto as mulheres possuem 1,24 m. Além disso, é comum o encurtamento de pernas e braços, cabeça e testa são proeminentes e há uma desproporção corporal de limitações físicas visíveis já no nascimento.
O desenvolvimento motor é mais lento devido aos membros e pescoço curtos e macrocefalia. A hipoplasia da face média em combinação com hipertrofia da adenóide e das amígdalas pode levar a apneia obstrutiva do sono. A otite média crônica é comum também nesse grupo de pacientes, assim como a perda auditiva. Já a estenose espinhal e lombar, com déficits neurológicos, são mais frequentes na idade adulta, tal como as doenças cardiovasculares. A obesidade também é comum.