Síndrome de Shwarman

Síndrome de Shwachman é uma desordem multissistêmica rara. Estima-se que cerca de um em 75 mil indivíduos tenham este transtorno. Embora possa ser grave e ter potenciais riscos de vida, os sintomas melhoram com a idade e com resultados relativamente saudáveis ao longo da vida.

Isso é exemplificado pelo mais conhecido dos indivíduos com este diagnóstico: Scott Hamilton, o patinador olímpico norte-americanao. Embora, por vezes, os indivíduos com esse processo sejam identificados pela primeira vez por causa de alterações ósseas, na verdade estas mudanças não são consideradas as características principais da Síndrome de Shwachman.

Para que esse diagnóstico seja sugerido, o indivíduo deve demonstrar disfunção no pâncreas exócrino somada à disfunção da medula óssea e alguma outra característica da Síndrome de Shwachman. Enquanto a terceira característica é muitas vezes uma alteração óssea, irregularidades ósseas displásicas não são obrigatoriamente essenciais para o fechamento do diagnóstico.

Naqueles com suspeita de Síndrome de Shwachman, os seguintes testes devem concluir o diagnóstico e delimitar quais tipos de características estão presentes:

1) 72 horas de gordura nas fezes e/ou tripsinogênio soro e/ou isoamilase soro e/ou teste de estimulação do pâncreas;

2) Hemograma completo, diferencial e contagem de plaquetas;

3) Estudo do Esqueleto.

Alguns também recomendam ressonância magnética (MRI) pancreática. Em todos os indivíduos suspeitos de ter Síndrome de Shwachman os testes de suor devem ser concluídos para descartar fibrose cística. Os testes genéticos já estão disponíveis.

Reincidência

A Síndrome de Shwachman sempre é uma condição genética autossômica recessiva. Isto significa que os pais de uma criança afetada têm uma chance de 25% de ter uma criança igualmente afetada.

Há um excesso inexplicável de homens com a condição. O gene causal foi identificado em 2003 e se chama SBDS (Síndrome de Shwachman-Bodian-Diamond).

Parece que todas as instâncias desta desordem são causadas por alterações do gene. A proteína SBDS é importante na formação do ribossoma (como é o caso dos genes envolvidos em algumas outras doenças que resultam na falha da medula óssea ou em insuficiência da medula óssea, mais anomalias do crescimento do osso, tais como a Hipoplasia da Cartilagem de Cabelo) e na formação do fuso mitótico (estrutura celular efémera, constituída por microtúbulos, envolvida na mitose e meiose).

Prevenções

As complicações médicas relacionadas à desordem a serem antecipadas podem ser observadas neste compêndio realizado com referência em artigos científicos publicados por faculdades de medicina especialmente concentradas no estudo de displasias ósseas, como é o caso da Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos. Informe-se:

a) Expectativa de Vida: A sobrevida média calculada é de cerca de 35 anos. Este número é provavelmente um muito radical. No entanto, existe um risco considerável de complicações fatais em todas as idades.

Na infância, as principais preocupações que podem ser mortais incluem má absorção, infecção e doença pulmonar restritiva, reflexos da distrofia torácica.

Em indivíduos mais velhos, mortes prematuras podem surgir como consequência das hemorragias, infecções ou malignidade.

Por razões desconhecidas, os homens parecem ser mais severamente afetados e frequentemente sofrem morte prematura. Mas muitos terão vidas longas e produtivas.

O aconselhamento dos pacientes e suas famílias deve incluir discussão sensível acerca desta realidade. Outra intervenção válida é a prevenção contra mortes prematuras relacionadas, principalmente, à gestão dos vários problemas não ósseos descritos abaixo.

b) Displasia Metafisária: Cerca de 60% de todos os indivíduos têm irregularidades ósseas facilmente identificáveis em raios-x. Isto inclui características da metáfise proximal do fêmur, pequenas alterações metafisárias nos joelhos e costelas em concha ou ausentes (em cerca de metade dos indivíduos).

A idade óssea atrasada também é comum. Estas alterações displásicas raramente originam complicações. Distrofia torácica com doença pulmonar restritiva e consequente risco de vida ocorre muito raramente em crianças. Epifisiólise Femoral (deslocamento do colo do fêmur à bacia) ocasional surge em crianças mais velhas.

A própria displasia metafisária (patologia na formação dos ossos) não requer monitoramento. Obviamente, se houver dificuldade respiratória na infância, há necessidade de avaliação urgente.

Somente complicações secundárias precisam ser gerenciadas, geralmente da mesma maneira que são em indivíduos sem Síndrome de Shwachman.

c) Problemas de Crescimento: Na maioria das vezes, os indivíduos têm tamanho normal ao nascimento, embora cerca de 30% seja levemente pequeno para a idade gestacional.

O crescimento normalmente diminui nos primeiros um ou dois anos de vida, mas, em seguida, retoma a velocidade normal. Uma minoria substancial atrasa no início da puberdade. A pequena estatura leve pode ser antecipada, com média de 1,52 metros para adultos.

d)  Escoliose: Por  diagnóstico clínico escoliose e cifoescoliose relevantes surgem em cerca de 10% dos indivíduos afetados.

A triagem de escoliose clínica anual deve ser concluída no período entre a idade escolar precoce e a adolescência. Se uma curva for clinicamente detectável, radiografias para escoliose devem ser realizadas.

Normalmente, as curvas não demandam tratamento e quando há agravo, podem ser gerenciadas da mesma maneira que na escoliose idiopática (sem razão conhecida), com tratamento padrão.

e) Osteopenia (diminuição progressiva da trama protéica do osso que, no entanto, permanece mineralizado): A maioria dos indivíduos afetados (e talvez quase todos) têm início precoce da osteopenia na infância. É leve mas pode se agravar se ocorrerem deficiências secundárias de vitamina D e/ou K.

O acompanhamento com DEXA (Densitometria Óssea – método inovador de mensuração da densidade mineral óssea e comparação com padrões como idade e sexo) deve iniciar por volta dos seis anos de idade e ser repetido a cada um ou dois anos, durante a infância. O escaneamento deve continuar com menor frequência na idade adulta.

Os métodos usuais de tratamento são adequadas principalmente com relação aos exercícios de rolamento de peso.

f) Insuficiência do Pâncreas: É a característica mais frequentemente de apresentação e geralmente surge na infância.

Cerca de 85% dos diagnosticados em última instância têm má absorção clinicamente significativa (enquanto, por definição, todos têm anormalidade em testes de estimulação do pâncreas).  

Caracteriza-se por função dúctil normal, função das ilhotas normal e função acinar anormal (tecido pancreático). A deficiência de enzimas pancreáticas resultantes causa esteatorreia (presença excessiva de gordura nas fezes), diarreia e má absorção. Pode ocorrer deficiência de vitaminas solúveis em gordura (A, D, E e K). Em mais de metade dos indivíduos afetados os problema pancreáticos melhoram com a idade.

Devem ser estabelecidos cuidados de rotina por meio de acompanhamento com um gastroenterologista pediátrico.

A confirmação da insuficiência pancreática pode ser feita via testes de soro de tripsinogênio ou testes de estimulação do pâncreas. No momento do diagnóstico, a avaliação deve incluir os níveis séricos de vitaminas A, D e E; protrombina (proteína plasmática inativa, precursora da trombina e essencial para a coagulação sanguínea) e tempo de tromboplastina parcial (TTP – exame que avalia a capacidade do corpo de formar coágulos).

Provavelmente, estes exames devem ser repetidos a cada seis meses. Insuficiência pancreática pode ser reavaliada a cada dois anos, por meio de análise de 72h da gordura fecal após 48h de descontinuação da terapia de reposição enzimática.

Terapia de substituição enzimática é um tipo de intervenção indicada pela literatura médica. Suplementos vitamínicos com A, D, E e K, conforme necessário, também é outra forma de melhorar as funções e prevenir problemas de insuficiência pancreática.

Raramente as crianças com deficiência grave necessitam de alimentação enteral (todo e qualquer alimento com finalidades especiais, como ingestão controlada de nutrientes, visando substituir ou complementar a alimentação oral em pacientes) por um tempo.

g) Consequências na Medula Óssea: Todos têm alguma evidência de envolvimento da medula óssea. Neutropenia (contagem mais baixa que o normal de um tipo de glóbulos brancos: os neutrófilos) – geralmente flutuante – em 85 a 100%; anemia (geralmente leve e sem grande importância clínica) em 40 a 80%; trombocitopenia (diminuição das plaquetas no sangue – geralmente leve) em 25 a 55%, muitas vezes com um histórico de contusões fáceis.

O último destes sintomas pode gerar, muito raramente, risco de hemorragia fatal quando combinado com a deficiência de vitamina K. Cerca de 10 a 20% dos indivíduos afetados terão pancitopenia (diminuição do número de todos os elementos figurados do sangue – hemácias, leucócitos, plaquetas) e é nessa população que o prognóstico é mais rebuscado.

Pancitopenia pode evoluir para anemia aplástica (falência do processo de hematopoiese – processo de renovação celular do sangue por meio de processos mitóticos – potencialmente fatal, caracterizada por um esgotamento das reservas medulares acompanhado de anemia grave, neutropenia e trombocitopenia).

Indivíduos afetados podem desenvolver alterações mielodisplásicas (irregularidades crônicas que apresentam, em comum, a redução de uma ou mais linhagens hematopoiéticas, responsável por mono, bi ou pancitopenia) que podem progredir para Leucemia Mielóide Aguda (LMA). O risco global de malignidade é de cerca de três a 15%.

Curiosamente, praticamente todos aqueles que desenvolvem LMA são do sexo masculino. A idade média do diagnóstico é de cerca de 14 anos (alcance entre um e 43 anos de idade). Historicamente, o resultado da LMA em indivíduos com Síndrome de Shwachman tem sido muito irrelevante.

No momento do primeiro diagnóstico, a monitorização deve incluir aspiração da medula óssea e biópsia (com estudos citogenéticos). Cuidados de rotina através de um hematologista pediátrico devem ser estabelecidos desde o início da vida.

Uma programação de triagem confiável deve incluir CBC (tipo de exame de sangue), diferencial e contagem de plaquetas a cada seis meses. Aspiração da medula óssea, biópsia e citogenética devem ser procedimentos repetidos a cada 24 meses.

Raramente alguns indivíduos requerem transfusões de plaquetas. Transplante de medula óssea tem sido eficaz, mas parece haver um aumento na frequência de complicações, com taxa de sobrevivência ao transplante de cerca de apenas dois terços.

h) Infecção e Imunidade: Existem múltiplas alterações que podem resultar em problemas imunológicos, incluindo neutropenia (contagem mais baixa que o normal do tipo de glóbulos brancos  denominados neutrófilos), quimiotaxia (mudança de orientação de organismos de vida livre ou células, em resposta a um estímulo químico) prejudicada e defeitos das células T.

Afetados são suscetíveis a ambas infecções bacterianas e virais, sendo constantes as infecções dos ouvidos, seios nasais e das vias aéreas superiores. Menos comumente, indivíduos irão desenvolver pneumonia, sepse (conjunto de manifestações graves em todo o organismo produzidas por uma infecção) e osteomielite (doença infecciosa grave, aguda ou crônica, causada especialmente pelo estafilococo áureo).

No momento do diagnóstico, a avaliação deve incluir imunoglobulinas quantitativas, subconjuntos de células B e T e  testes de estímulo mitogênico. Caso seja encontrada qualquer irregularidade, importante encaminhar para um imunologista pediátrico.

Em geral, as infecções são eficazmente tratadas com uso intensivo de antibióticos. Naqueles com neutropenia profunda alguns recomendam uso de Granulokine (medicamento contra efeitos da  quimioterapia), mas é possível que esta droga predisponha indivíduos tratados para malignidade.

i) Alterações Hepáticas: A maioria das crianças com Síndrome de Shwachman (50 a 80%) terá elevação das enzimas hepáticas e 10 a 20% terão hepatomegalia (aumento anormal do volume do fígado). Essas taxas normalizam com a idade e parecem não ter significado clínico.

j) Alterações nos Dentes: Várias características foram relatadas, incluindo esmalte displásico; atraso na erupção dos dentes secundários; e risco em excesso de cáries e doenças periodontais.

O paciente com Síndrome Shwachman precisa de assistência odontológica cuidadosa e avaliação dentária a cada seis meses. As intervenções indicadas não são diferentes das realizadas na rotina do tratamento odontológico.

k) Riscos Cardíacos: Embora existam diferenças sutis na função miocárdica em muitos adultos afetados, elas não são clinicamente relevantes.

No entanto, algumas crianças ocasionalmente irão desenvolver necrose miocárdica. Cardiomiopatia sintomática costuma ocorrer com pouca frequência em indivíduos mais velhos.

Estas complicações são tão raras que nenhum monitoramento de rotina parece adequado.

l) Associações de Causas Raras e Incertas:

1) Dificuldades de aprendizagem parecem estar presentes em cerca de 10% dos indivíduos afetados e as mudanças mais sutis podem ser ainda mais frequentes.

(2) A disfunção renal e acidose tubular renal estão ocasionalmente presentes.

(3) Alterações endócrinas (tireoide, paratireoides) surgem ocasionalmente.

São indicados rastreio anual de uréia, creatinina, TSH (exame da tireoide), cálcio, fosfato, PTH (exame do hormônio da paratireoide) e tratamentos de rotina para quaisquer problemas que surgirem.

m) Risco de Cirurgia: Riscos para cirurgias ou trabalhos dentários principalmente relacionados com complicações hemorrágicas e, em menor grau, com infecções pós-operatórias.

Avaliar PT (tempo de protrombina), PTT (tempo de tromboplastina parcial) e contagem de plaquetas antes de qualquer cirurgia ou procedimento dentário invasivo é especialmente importante.

É imprescindível tratar qualquer alteração de coagulação, conforme o exigido e considerar a cobertura de antibiótico profilático com antecedência de, por exemplo, cinco dias antes da cirurgia.

Fontes: Little People of America (LPA), Academia Americana de Pediatria, Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro (Soperj), Fundacion Alpes (Espanha), Empresa Brasileira de Comunicação, Portal dos Psicólogos, Universidade de Wisconsin (Estados Unidos da América), Universidade de Campinas (Unicamp), Infoescola, G1, Hospital Sírio Libanês, Grupo de Coluna do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Vila Velha Hospital e Hospital Santa Casa de Misericórdia de Vitória do Espírito Santo (EMESCAM), artigos científicos do SciELO (Scientific Eletronic Library Online), Superinteressante, Site Dr. Dráuzio Varella, Sociedade Brasileira de Patologia Clínica (SBPC), Universidade de São Paulo (USP), Hospital Albert Einstein (da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira), Revista de Atualização Médica (Uol), Liga de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (Portugal), Instituto Latino Americano da Sepse (ILAS), Faculdades Adamantinenses Integradas (FAI), Michaelis (Dicionário Uol).

Rafaela Toledo

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