Crianças com acondroplasia possuem risco aumentado para quadros respiratórios

Álvaro passou 15 dias entubado e outros 16 dias em observação devido a uma bronquiolite

Casos recentes de complicações entre famílias do INN reforçam alerta para cuidados e vacinação

Crianças com acondroplasia possuem risco aumentado para quadros respiratórios. A afirmação é da otorrinolaringologista pediátrica Melissa Avelino, professora da Universidade Federal de Goiás (UFG) e ex-presidente da Academia Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica. A constatação, que não tem como objetivo gerar pânico, apenas pede uma alerta ampliado para os sintomas gripais e para a necessidade de atualização da caderneta de vacina. Nos últimos meses, o Instituto Nacional de Nanismo (INN) registrou pelo menos três mortes de crianças com doenças como pneumonia e bronquiolite e outros vários casos de internação. 

Nariz entupido, sintomas gripais e febre. Estes foram os primeiros sintomas da Helena Fernandes, de 8 meses, que morreu com pneumonia menos de 30 horas após o início dos sintomas. Moradora de Araguapaz (GO), a menina tinha acondroplasia. A mãe, Ana Paula Fernandes Caetano, conta que com apenas um mês de vida, Helena apresentou nariz entupido e foi levada ao posto de saúde da cidade. “Ela passou remédios, lavagem nasal, mas nada desentupia esse nariz. Voltei, pediram um raio-X e não tinha nada. Pouco tempo depois ela gripou, sarou, mas o nariz permanecia entupido” , conta. 

Helena Fernandes, de 8 meses, morreu após um quadro de pneumonia

A mãe conta que no último dia 22 de maio ela teve uma febre alta por volta de 13h, tomou remédio, mas a febre retornou à noite. “Decidi não medicar e levei ela para o hospital municipal da minha cidade. Chegando lá, já internaram ela porque a oxigenação estava oscilando. Um novo raio-X foi feito e constatada pneumonia. Passou a noite tomando antibiótico e no dia seguinte teve uma parada cardiorrespiratória. Ela foi transferida para a capital, no Hospital das Clínicas, da UFG. Antes de ser entubada, ela teve uma nova parada cardiorrespiratória e não resistiu”, explica Ana. 

Melissa Avelino explica que crianças com malformações possuem risco ampliado para quadros respiratórios. No caso da acondroplasia, que envolve malformações craniofaciais a complicação se dá em relação às vias aéreas superiores. De forma geral, crianças com menos de dois anos de idade, que ainda possuem sistema imunológico mais imaturo, possuem maior risco de complicações e óbitos. “No caso da acondroplasia, a anatomia predispõe mais a distúrbios respiratórios, como, por exemplo, apneia obstrutiva do sono. Da mesma forma predispõe mais a quadros como o vírus do influenza ou o Vírus Sincicial Respiratório (VSR), este último responsável pela bronquiolite”, completa a otorrinolaringologista. 

Para a médica, dois pontos são muito importantes: calendário vacinal atualizado e um médico de confiança para os primeiros sintomas. “A vacina é uma forma de prevenir casos mais graves e além disso, é importante que diante dos primeiros sintomas as famílias tenham um pediatra da sua confiança ou um médico que possa trazer uma assistência adequada, evitando assim que o quadro se complique e a criança necessite ir para uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), ser entubada ou que possa evoluir para desfechos ainda mais graves”, finaliza. 

Daniela Evangelista, de 36 anos, é moradora de Santa Isabel (SP) e perdeu o filho Ravi Felix, de apenas 6 meses, para uma bronquiolite. O menino, que tinha acondroplasia, começou com sintomas gripais após contato com um primo que estava com sintomas mais leves. “Meu sobrinho ficou normal, com sintomas de uma gripe leve. Ravi tinha desde o nascimento uma respiração mais forte, pesada e os sintomas vieram fortes com febre alta. Ele ficou 6 dias internado e saiu do hospital bem melhor. Depois de uma semana em casa, teve um pico de febre de 39ºC e sentimos uma melhora. Ravi não estava mamando e até voltou a mamar, parece que estava se despedindo. Ele faleceu na minha casa no dia 14 de março. Estávamos eu, ele e o pai. É muito triste. Eu não sabia que a bronquiolite era mais grave em crianças com acondroplasia. Não sabia que era uma doença tão perigosa, mas levou meu Ravi”, chora ao recordar. 

Ravi, de 6 meses, morreu por bronquiolite

Pulmões em alerta! 

Nas crianças com nanismo também pode ocorrer uma restrição de expansibilidade pulmonar. Quem explica é a pneumologista pediátrica Patrícia García-Zapata, mestre pela Universidade de São Paulo (USP). “Por questões anatômicas, o nanismo faz com que esses pacientes tenham uma restrição de expansibilidade pulmonar e restrição de expansibilidade da caixa torácica. Além disso, nos quadros de nanismo a gente tem uma maior fraqueza dessas paredes, tanto das vias aéreas quanto da musculatura e isso, de certa forma, acaba induzindo a uma suscetibilidade maior e uma gravidade maior”, acrescenta. Patrícia diz, que, assim como ocorreu no caso da Helena, as crianças com acondroplasia possuem maior dificuldade na eliminação de secreções e que isso leva, infelizmente, a quadros mais arrastados, prolongados e graves.  

Álvaro Guilherme tem 5 meses e também é acondroplásico. O bebê é filho de Anaide Nascimento, de 28 anos, e mora em Petrolina (PE). No último mês, ele passou 15 dias entubado e outros 16 dias em observação devido a uma bronquiolite. Nesta semana, ele retornou ao hospital. A mãe conta que além de toda a situação que envolve a saúde, a família também precisou se desdobrar para cuidar do outro filho de 6 anos. “Enquanto eu estava no hospital, o pai ficou em casa com o mais velho pra que ele não perdesse aulas na escola. Sem trabalhar, perdemos dinheiro e agora estamos nos desdobrando para tentar colocar as contas no lugar”, completa. 

Anaide explica que foi a primeira vez que ele teve problemas respiratórios. “Ele começou com uma coriza, achei que era uma gripe normal. No primeiro dia não teve febre, mas no segundo dia já teve febre e fomos para o posto de saúde e assim que foi atendido, a enfermeira já pediu encaminhamento para um hospital”, recorda. Entre as orientações do médico, um pedido para evitar locais aglomerados e não deixar que as pessoas beijem as mãos, por exemplo, já que os bebês levam sempre à boca. Nesta semana, com novo quadro de febre, o bebê precisou retornar ao hospital. 

Vacinação em dia

A pneumologista também alerta para a importância das vacinas atualizadas. “A condição do nanismo não contra indica nenhuma vacina. Pelo contrário, é preciso uma atenção muito maior para atualização desse calendário vacinal. Temos vacina contra influenza, que inclusive estamos em surto atual. Temos vacina contra Covid, contra o vírus sincicial respiratório (VSR) – causador da bronquiolite, claro aí respeitadas as suas orientações e abordagens em termos de idade. Temos vacinas também para quadros bacterianos, as vacinas pneumocócicas. Vacinas contra coqueluche.”

Há aproximadamente dois anos a chamada vacina da bronquiolite já está disponível para os idosos e recentemente, também foi aprovada para gestantes e incorporada ao SUS. Para crianças de até 11 meses e 29 dias, entretanto, a vacina ainda não engloba, de forma gratuita, todas as crianças, mas apenas um grupo que envolve prematuros e cardiopatas, por exemplo. A busca agora é para que crianças com nanismo também passem a fazer parte dessa lista, explica a presidente do INN, Juliana Yamin. De forma particular, ela pode ser encontrada e a indicação é que, quem tiver condições financeiras de custear, aplique. 

“As famílias que têm condições financeiras de fornecerem esse anticorpo para as suas crianças desde estabelecidas as faixas etárias é muito válido e principalmente para pacientes com acondroplasia, que já tem uma restrição de caixa torácica com uma predisposição maior para doenças respiratórias. Claro que se a gente considerar que o nanismo é considerado um grupo de risco para doenças respiratórias de forma geral tanto vírus quanto bactérias. Esses bebês eles deveriam sim ser inseridos nesse grupo alvo dessa vacina pelo SUS. No entanto, o SUS apenas liberou para bebês prematuros, independente de haver patologia de base ou não. Então, quem nasce com 36 semanas e 6 dias ou menos de idade gestacional entra nesse grupo de risco, pacientes com cardiopatia, alguma doença cardiológica de base e pacientes com doenças pulmonares crônicas”, completa a pneumologista Patrícia García-Zapata. 

Fisioterapia respiratória pode ser importante 

“As crianças com acondroplasia  têm uma indicação de realização de fisioterapia respiratória de forma contínua e não só feita essa intervenção quando existe uma doença respiratória porque isso facilita inclusive o auxílio para eliminar secreções e melhorar a mecânica respiratória. A vacinação deve estar sempre atualizada mas é também necessário acompanhamento multidisciplinar quando se trata de saúde. Não estou falando apenas de  fisioterapeuta respiratório, mas de ortopedistas, pneumologistas, otorrinolaringologistas. O cuidado precisa ser de forma multidisciplinar”, finaliza Patrícia. 

Catherine Moraes

Jornalista por formação e apaixonada pelo poder da escrita. Do tipo que acredita que a informação pode mudar o mundo, pra melhor!
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