Palestra do INN no RJ mescla histórias de vida e cenário do nanismo no país 

O Instituto Nacional de Nanismo (INN) esteve presente, neste sábado (23), no 1º Congresso de Doenças Raras, Autismo e Educação, que foi realizado no Rio de Janeiro no fim de semana. A presidente do INN, Juliana Yamin, o líder do Movimento Somos Todos Gigantes, Gabriel Yamin, e o ator Gigante Léo, que também faz parte do Instituto, participaram da palestra “O cenário do nanismo no Brasil: considerações técnicas e experiências de vida”.

Aos 16 anos, Gabriel, que tem acondroplasia, o tipo mais comum de nanismo, contou sobre as características e comorbidades de sua deficiência e das cirurgias que já fez, além de falar sobre o movimento Somos Todos Gigantes. Ele falou também das dificuldades da pessoa com nanismo no dia a dia. “Esse preconceito é culturalmente enraizado, arraigado, na sociedade. Parece que o anão ainda é a piadinha. Parece que a pessoa com nanismo ainda é só o anão da história. Então, a gente quer o fim desse preconceito. A gente quer também um acesso igualitário para tratamentos e a profissionais de saúde, porque isso é um negócio muito escasso no Brasil. A gente teve dados sobre geneticistas. Geneticista é a especialidade médica que menos tem representante no Brasil e é uma das especialidades mais necessárias, especialmente no contexto de doenças raras, de deficiências e no contexto da pessoa com nanismo também. A gente precisa ter um acesso maior e igualitário”, reivindicou.

Mãe de Gabriel, Juliana Yamin contou como a chegada do filho mudou sua visão de mundo e o início da sua busca por mais informações sobre nanismo, que ocasionou na criação do Instituto. “A gente teve o privilégio, através da vida do Gabriel, de conhecer… A sensação que eu tenho quando o médico deu esse diagnóstico e um buraco se abriu no chão é que eu caí no buraco da Alice. Quem já leu ou assistiu ‘Alice no País das Maravilhas’ sabe que ela caiu no buraco e encontrou um mundo muito diferente do que ela vivia. E eu acho que cai nesse buraco da Alice e descobri um universo paralelo que eu nunca tinha parado para olhar”. 

Além do apoio às famílias e a quem têm a deficiência, o Instituto começou um cadastramento das pessoas com nanismo. Juliana explicou também por que ainda não é o momento da deficiência ser uma das questões do censo feito pelo governo federal. “O Instituto está fazendo um cadastramento da nossa comunidade, da comunidade que a gente atende. Sem pretensão de ser um censo, porque isso não é possível. Nós já conversamos muito em Brasília e a gente entendeu que o censo da comunidade vai depender de um outro momento. A gente precisa internamente que as pessoas se conscientizem do que é a condição dela para que no momento que o recenseador vá entrevistá-las, ela se identifique como pessoa com nanismo”.

Juliana falou ainda sobre a importância dos encontros anuais feitos pelo Instituto. “A gente promove esses encontros exatamente para as pessoas entenderem que elas pertencem a uma comunidade. As crianças têm crescido se reconhecendo umas nas outras, tendo oportunidade de conviver com tantas outras com características semelhantes. Isso é muito importante”, disse. “Os nossos momentos se chamam encontros, que é isso que queremos promover. É isso que nós queremos que as pessoas percebam, que elas não estão sozinhas. Apesar de serem únicas, elas não são as únicas com a condição. E aí é uma troca de informação, uma troca de vivência acima de tudo”, completou.

Com bom humor e consciência

Com displasia diastrófica, um outro tipo de nanismo, Gigante Léo contou, com bom humor, passagens de sua vida com a deficiência. Quando era mais novo, a preocupação de sua mãe era outra quando ele saía com amigos. “Quando eu ia viajar com coleguinha, ela nunca falou para a pessoa assim: ‘olha, toma cuidado com o Léo, porque ele tem nanismo e sei lá o que’. Não, ela já dizia: ‘olha, abre o olho com o Léo, porque ele é um capeta. Se você der mole, ele vai estar trepado sei lá onde e se quebrar a perna vai dar um trabalho pra gente. E pode dar esporro nele mesmo, porque ele é levado’. Então, era essa a preocupação”.

“Graças a toda criação que eu tive, eu sempre enxerguei como uma pessoa como outra qualquer. Como eu digo, brincando, muitas das vezes eu esqueço que eu tenho nanismo, porque é igual qualquer pessoa, e só vou perceber alguma coisa assim quando penso ‘putz, não alcanço aqui. Ah, é porque eu sou mais baixinho’”, disse o ator.

Casado e com uma filha, Gigante Léo revelou também que sua sogra tinha preconceito, mas não era por causa de sua deficiência. “Na família da Carol, rolou um preconceito. Mas não porque eu tinha nanismo. E, sim, porque eu era artista. Veja só, já não basta ter nanismo, ter que encarar a parada toda, agora o preconceito é porque sou artista. Vou contar a história: eu estava gostando dela, flertando, namorando. E falei, ‘vou convidar para sair, nas boas intenções, com todo respeito’. Aí eu estava fazendo um show, Comédia em Pé, e falei que iria pegá-la, levaria ao show, depois a gente janta e volta. Ela contou para a mãe, que disse ‘não, você não vai, porque artista é assim. Pega uma mulher a cada show’”, contou. “Eu queria muito que essa visão da minha sogra fosse realidade”, completou brincando.

Após o nascimento de sua filha Luiza, Léo começou a se questionar sobre esse novo papel que assumiu. “Que pai eu ia ser para minha filha. Eu sabia que não ia conseguir jogá-la para o alto e pegá-la. É mais fácil ela me jogar para o alto. Eu não ia conseguir fazer uma porção de coisas que os pais com outras estaturas conseguiriam fazer. Até o momento que ela me ensinou uma grande missão. Falei, ‘cara, você tá sendo capacitista com você mesmo’. Que foi uma situação que, na nossa casa, nós temos gatos, cachorros, é uma fauna. E ela já está acostumada, só que gato é maluco. Do nada, sai correndo. E, dessa vez, o gato saiu correndo, passou perto dela, ela na mesma hora ficou desesperada e aí correu para cima de mim, pulou em cima de mim. Eu tive que segurar de qualquer maneira, senão ia rolar: eu, ela, o gato, ia ser uma tragédia. Eu segurei, falei ‘calma aí, filha’, mas, neste momento, caiu a ficha. Para a Luiza, não importa se eu tenho limitação ou não tenho. Ela me enxerga até hoje como seu pai, seu protetor, seu super herói, no cara que vai protegê-la”.

Léo aconselhou também famílias de pessoas com deficiência. “Temos que vencer essa barreira, encarar com naturalidade pessoas que têm nanismo. Nós realmente podemos fazer todas as coisas, como qualquer outra pessoa, mas a gente também não precisa ficar com uma autocobrança doida do tipo: ‘ah, eu tenho um filho que tem uma deficiência e eu ainda não consegui enxergá-lo de uma forma sem ser com pena, sem ser com tanta proteção’. Não tem problema. Isso é um processo que acontece com qualquer pessoa. Aconteceu comigo, que sou uma pessoa com deficiência e tive uma vida e uma educação assim ‘cara, você pode tudo’. E, realmente, com o apoio da minha família, eu pude fazer muita coisa. Mas em alguns momentos da vida, eu também me peguei nessa: ‘nossa, será que sou capaz?’. Então, isso é um processo que todos nós temos que, com muita sabedoria e calma, ir tentando avançar a cada dia. Seja você pai, mãe, seja você pessoa que tenha deficiência”.

Sabrina Pirrho

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