UMA TRAGÉDIA ANUNCIADA

Decisão do STF ameaça à vida de milhares de pacientes com doenças raras


O recente movimento do Supremo Tribunal Federal (STF) para centralizar a concessão de medicamentos exclusivamente no Sistema Único de Saúde (SUS) e na Conitec tem levantado preocupações graves sobre o futuro do acesso a tratamentos, especialmente para pacientes com doenças raras. Essa decisão, que à primeira vista parece uma tentativa de organizar o sistema judiciário e de saúde, na prática, pode resultar na morte de milhares de pessoas, criando uma crise humanitária sem precedentes.

Uma Barreira ao Acesso

A exigência de comprovações cumulativas para a concessão judicial de medicamentos, em vez de constituir-se um remédio aos pacientes em situações de urgências e de única salvação, pode criar obstáculos intransponíveis. Aqueles que sofrem de doenças raras, muitas vezes sem tratamentos disponíveis no SUS, já enfrentam uma dura realidade: o tempo não está do seu lado. A deterioração rápida de suas condições de saúde exige tratamentos imediatos, e a demora causada por processos administrativos e judiciais prolongados pode ser irreparável. Para esses pacientes, cada dia conta, e qualquer atraso pode significar a diferença entre a vida e a morte.

A exigência de aprovação na Conitec, com seus critérios pouco claros, ambíguos, baixa capacidade técnica e sua falta de agilidade, torna o acesso ainda mais complicado. A morosidade nos processos de avaliação, que podem demorar entre oito meses e um ano, agrava ainda mais a situação. Isso afasta os pacientes do acesso a medicamentos inovadores e deixa muitos à mercê de um sistema público de saúde já desassistido, que sem o judiciário não terá qualquer controle, fazendo a decisão de comitê recomendatório definitivo e imutável.

A Falta de Estrutura da Conitec

A Conitec, órgão responsável por opinar sobre a incorporação de medicamentos no SUS, simplesmente não tem a estrutura necessária para atender à demanda crescente por novos tratamentos, especialmente para doenças raras. Além disso, a falta de representatividade da sociedade civil e de especialistas nessa área faz com que o órgão esteja vulnerável a influências políticas e econômicas. Decisões que deveriam ser puramente técnicas acabam sendo impactadas por questões de custo-efetividade, uma métrica inadequada para avaliar tratamentos de alto custo e baixo retorno financeiro, como os medicamentos para doenças raras.

Esse cenário gera uma barreira significativa à incorporação de novos tratamentos, deixando pacientes dependentes do Judiciário para garantir o acesso a medicamentos vitais. A centralização das decisões na Conitec, sem as reformas estruturais necessárias, pode resultar em uma verdadeira crise de acesso, com milhares de pacientes desassistidos.

Um Retrocesso na Inovação

A exigência de laudos baseados em ensaios clínicos rigorosos também cria desafios imensos para a inovação no Brasil. Medicamentos inovadores, especialmente aqueles registrados cada vez mais prematuramente, porém com todas as comprovações de segurança, eficácia e qualidade da Anvisa, cumprem um importante papel de atendimento a doenças raras, de rápida progressão e extremamente graves. Entender esta situação, seja na Conitec ou no judiciário, as pesquisas clínicas são uma outra forma
excepcional de dar tratamento a estes pacientes. Estimular a pesquisa clínica no país é outro grande objetivo do sistema. A nova legislação que obriga o tratamento vitalício dos pacientes participantes de pesquisas clínicas para doenças raras é outro fator que afasta empresas de biotecnologia e farmacêuticas do Brasil.

Antes da mudança legislativa, havia uma regra que permitia o tratamento por cinco anos após o registro do medicamento, o que incentivava a pesquisa no país. Agora, com os custos crescentes e o retorno econômico limitado, a pesquisa clínica no Brasil enfrenta um futuro incerto. Isso representa um grande retrocesso para a inovação e o desenvolvimento de novas terapias avançadas, como a terapia gênica.

Uma Crise Humanitária em Formação

Ao transferir toda a responsabilidade de garantir medicamentos para o sistema público, sem proporcionar os recursos e suporte necessários, o STF está criando um cenário onde os problemas de acesso e escassez no SUS só tendem a se agravar. O sistema público já enfrenta grandes desafios em termos de recursos e logística, e essa nova demanda pode sobrecarregá-lo ainda mais.

A centralização das decisões em um órgão que carece de estrutura, agilidade e transparência, como a Conitec, vai gerar um aumento inevitável de ações judiciais. Pacientes e famílias desesperadas continuarão a recorrer ao Judiciário para garantir os tratamentos de que precisam, sobrecarregando ainda mais um sistema já em colapso.

A Morte de Milhares de Pacientes

As consequências dessas decisões são claras: a morte de milhares de pacientes. E quando falamos em milhares, estamos nos referindo a um número de vidas perdidas que pode superar o de conflitos em zonas de guerra, como a Faixa de Gaza. Essas mortes não são causadas por balas ou bombas, mas pela burocracia, pela ineficiência e pela falta de uma política de saúde pública que priorize a vida humana. Estamos condenando à morte pessoas que poderiam se tornar futuros médicos, advogados, políticos e pesquisadores, que poderiam contribuir para o progresso e a transformação do Brasil.

Conclusão

O Brasil não precisa de guerra para matar seus cidadãos; decisões judiciais equivocadas que limitam o acesso a medicamentos e tratamentos essenciais, já estão fazendo esse trabalho. A responsabilidade do Supremo Tribunal Federal e da Conitec vai além de questões técnicas e orçamentárias: trata-se de salvar vidas. O país está caminhando para uma tragédia silenciosa; a falta de acesso a tratamentos pode matar mais do que qualquer conflito armado. É preciso agir agora para evitar essa catástrofe. A pergunta que fica é: quem será responsabilizado pelas vidas perdidas? O tempo está passando, e para milhares de brasileiros, o futuro está sendo decidido em salas de reuniões e tribunais, longe das suas camas de hospital e de seus sonhos de cura.

Antoine Souheil Daher
Presidente da FEBRARARAS – Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras
Comentários

Uma resposta

  1. Se um ministro tivesse um filho com problemas, rapidamente dariam um jeito.
    Um absurdo. Brasil andando de marcha ré.
    Não vou comentar mais nada.
    É revoltante.

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