Catherine Moraes
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, nesta terça-feira (11/4), a tramitação de todos os recursos que envolvem a compra de medicamentos pela União que, apesar de serem registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), não estão incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A medida, que inicialmente inclui processos em instância superior que estejam em andamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou STF, pode respingar em casos envolvendo o Voxzogo, primeiro medicamento aprovado para acondroplasia, o tipo mais comum de nanismo. Até o momento, ele só é fornecido para as famílias por meio de decisões judiciais.
A decisão faz parte de uma ação que discute sobre a responsabilidade da União nestes processos. O caso, por sua vez, chegou ao STF por meio de um recurso extraordinário do Estado de Santa Catarina e a suspensão dos recursos vale até que haja uma decisão definitiva da Suprema Corte. “Esse julgamento suspende apenas os processos que estão em andamento no STF ou STJ, em recursos especiais ou extraordinários, em última instância. Ele não atinge os processos das nossas crianças que estão em primeiro grau, alguns ainda nem sentenciados. Mas esse julgamento serve de alerta porque vão delimitar as ações que serão propostas contra a União. Então, apesar de não ter efeito agora, vão nortear as ações judiciais mais adiante”, explica a advogada especialista em acesso à saúde, Anaísa Banhara.
Presidente do Instituto Nacional de Nanismo, Juliana Yamin considera a decisão um retrocesso para as conquistas da comunidade e teme a paralisação da utilização do medicamento, assim como a negação do fornecimento para os próximos pacientes. “Estamos diante de um grande retrocesso das conquistas que nossa comunidade vinha alcançando e do desrespeito à vida e a equidade de tratamento das pessoas. Os avanços com a utilização do medicamento são inegáveis, e os efeitos da paralisação do uso são perceptíveis em pouquíssimo tempo. Desconsiderar o direito à qualidade de vida de pacientes com doenças raras é desumano e inconcebível do ponto de vista dos direitos da pessoa humana. Estamos estarrecidos com a postura dos decisores”, acrescenta.
Na decisão, o ministro considerou como “imprescindível” a suspensão nacional dos processos que tratam da matéria, mas reconheceu também que o tema é sensível e que a suspensão das instâncias ordinárias poderia causar “graves e irreparáveis” danos à saúde dos pacientes.
“Diante da complexidade e sensibilidade do tema, eventual ordem de suspensão do andamento processual nas instâncias ordinárias de todos os feitos sobre a temática poderia ocasionar graves e irreparáveis danos à saúde dos pacientes, de modo que é recomendável apenas a suspensão do processamento dos recursos especiais e extraordinários em que haja discussão sobre a necessidade de inclusão da União no pólo passivo da demanda, nos moldes já implementados por esta Corte”, explica o ministro na decisão.
O que é o Voxzogo?
Liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em novembro de 2020, o medicamento estimula o crescimento e pode diminuir as complicações causadas pela deficiência. Quando o medicamento foi aprovado no Brasil, as duas principais agências reguladoras do mundo já haviam aprovado a utilização: a Agência Americana – Food and Drug Administration (FDA) e a Agência Europeia de Medicamentos – European Medicines Agency (EMA). O custo anual, entretanto, é de R$ 1,39 milhões e, como a droga ainda não integra o Sistema Único de Saúde (SUS), as famílias têm recorrido à Justiça para garantir o acesso.
Quantas crianças e adolescentes já estão usando?
Levantamento realizado em 23 de fevereiro pela BioMarin, laboratório responsável pelo remédio, apontava que no Brasil 61 crianças já utilizavam o medicamento. A advogada Anaísa Banharadiz que possui, apenas em seu escritório, 59 processos de crianças em andamento para fornecimento do Voxzogo e que destas, 37 já estão recebendo a medicação. Outros 11 estão em fase de depósito do valor para compra do remédio. Todos os processos tramitam, entretanto, na primeira instância do Poder Judiciário.